O Casamento no novo Código Civil
O NOVO Código Civil (Lei 10.406/2002) entrará em vigor no dia 11 de janeiro de 2003.
1. REGRAS GERAIS DE TRANSIÇÃO
A edição de uma lei que vai substituir outra provoca um conflito de leis no tempo, ou seja: uma que vigora a partir de sua publicação e a outra (velha) que obedece o principio da irretroatividade da lei, que impede que o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, sejam atingidos pela lei nova. (Constituição Federal, Art. 5º, XXXVI. E Lei de Introdução ao Cód. Civil , art. 6º, § 1º e 2º).
O casamento é um ato solene precedido de um processo de habilitação. Dessa forma, teremos no dia 11.01.2003, muitos casamentos em fase de habilitação e casamentos religiosos pendentes de registro. Ademais, existe a possibilidade da nova legislação ser aplicada a casamentos celebrados e registrados antes da entrada em vigor do Novo Código Civil, notadamente a possibilidade de alteração do regime de bens entre os cônjuges. Assim devemos estar preparados não apenas para a correta aplicação das novas disposições legais, como também para a fase de transição.
2. GRATUIDADE DO CASAMENTO CIVIL
O art. 1512, parágrafo único, assegura às pessoas cuja pobreza for declarada, o direito à isenção de emolumentos e despesas para a habilitação.
No nosso caso, a Lei 6.670/01 (que vai ser modificada no ano 2003), prevê o ressarcimento de todos os atos gratuitos praticados pelo registrador civil. Se na Assembléia Legislativa retirarem esse artigo será o fim do registro civil neste Estado. Não acreditamos nisso, pois a Lei Federal 10.169/2000, artigo 8º, prevê o ressarcimento dos atos gratuitos.
Quem então terá direito a isenção? A lei apenas exige a declaração, que deverá ser firmada por ambos os nubentes. Deve o Oficial sempre alertar de que a falsidade ensejará responsabilidade civil e criminal dos interessados. E a publicação dos editais de proclamas? Quem pagará? Deverá ser custeada pelo Estado, por meio da imprensa oficial.
3. PRAZO DE REGISTRO DO CASAMENTO RELIGIOSO
O art. 1.514 dispõe que o casamento religioso produz efeitos a partir da data da celebração e depende de registro a ser feito no prazo de 90 dias da realização por iniciativa do celebrante ou de qualquer interessado (art. 1516, § 1º). Deve ser observado que os casamentos celebrados até 11.12.2002 estarão sujeitos ao prazo de 30 dias. (Lei 6.015/73, art. 73), enquanto que os celebrados a partir de 12.12.2002, terão o prazo de 90 dias para registros.
4. CAPACIDADE CIVIL PARA O CASAMENTO
A partir de 11.01.2003, o homem e a mulher com dezesseis anos poderão casar (com autorização dos pais, ou de seus representantes legais). Os que necessitarem casar antes dessa idade, dependerão de alvará judicial.
5. DOCUMENTOS PARA A HABILITAÇÃO
a) Certidão de nascimento ou documentos equivalente (art. 1.525, I). Constará do assento de casamento a relação dos documentos apresentados ao oficial de registro.
b) A certidão ou certificado de habilitação deverá mencionar os documentos apresentados de acordo com a lei em vigor na data do requerimento. Assim, se o processo de habilitação for iniciado sob a égide do Código Civil atual, obviamente, a relação será baseada no art. 180. A partir de 11.01.2003, os certificados de habilitação expedidos e os assentos de casamentos lavrados, devem, ao indicar o artigo 180 referi-lo como do Código Civil anterior (Lei 3.071/1916).
6. HOMOLOGAÇÃO DA HABILITAÇÃO DE CASAMENTO PELO JUIZ
O Novo Código Civil diz que a habilitação será feita perante o oficial de Registro Civil e, após a audiência do Ministério Público, será homologada pelo juiz (art. 1.526). Assim, a nova lei dispõe claramente que será necessária, sempre, a homologação do juiz. Contudo, não esclarece quem é a autoridade competente pra tanto: o juiz de paz ou o juiz de direito.
A Constituição Federal de 1988 estabelece que os Estados criarão a justiça de paz, com competência para, na forma da lei, celebrar casamentos, verificar, de ofício ou em face de impugnação apresentada, o processo de habilitação, a justiça de paz. Aliás, pelo Código Civil atual, compete a quem presidir a celebração opor os impedimentos do art. 183, I a XII, (artigo 189, II), dever ser mantido pelo Novo Código Civil (art. 1.522, parágrafo único).
A partir da vigência da lei nova, os impedimentos continuarão sendo declarados pelo juiz de paz e oficial de registro (art. 1.522, parágrafo único), e opostos pelo Ministério Público (Lei 6.015/73, art.67, § 2º). Assim sendo, a exigência de homologação da habilitação será feita pelo juiz de paz. O juiz de direito deverá se pronunciar apenas quando haja oposição de impedimentos ou impugnação do Ministério Público.
7. ESCLARECIMENTOS AOS NUBENTES
É dever do oficial esclarecer os nubentes sobre os diversos regimes de bens (art. 1528 do Novo C. Civil).
8. CERTIFICADO DE HABILITAÇÃO
Cumpridas as formalidades dos artigos 1.526 e 1.527, a partir da vigência do Novo C. Civil, o oficial extrairá o CERTIFICADO de habilitação (art. 1531) e não certidão de habilitação.
9. CONTEÚDO DO ASSENTO
O art. 1536 do Novo C. Civil repete a exigência do art. 195 do código vigente, quantos aos elementos do assento de casamento, alterando apenas a terminologia para PRENOMES, SOBRENOMES. Existindo a possibilidade de o homem também poder alterar seu nome. Assim, deverá constar do assento, além dos requisitos do art. 195 do Código Civil: nacionalidade e local de nascimento dos cônjuges; nacionalidade das testemunhas; o nome que passa a ter a mulher ou o homem; nomes e idades dos filhos havidos do matrimônio anterior ou correspondente à prole comum antecedente.
10. PRAZO DE EFICÁCIA DA PROCURAÇÃO “AD NÚPCIAS”
O art. 1.542 do Novo Código Civil exige poderes especiais para o casamento através de procuração e tem que ser instrumento público e limita a eficácia do mandato ao prazo de noventa dias (excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento - art. 132).
11. PRAZO PARA TRANSCRIÇÃO DO CASAMENTO
Foi fixado o prazo de cento e oitenta dias a contar da volta de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil, para registro do casamento de brasileiro, celebrado no estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou cônsules brasileiros (art. 1.544). Contudo, o decurso do prazo não impedirá a transcrição do assento. Isto porque o casamento celebrado no exterior é um ato jurídico ao qual a lei brasileira confere valor, sendo o registro mera condição de oponibilidade a terceiros. Com efeito, o art. 32 da Lei 6.015/73, estabelece que os assentos de casamento de brasileiros em país estrangeiro serão considerados autênticos, nos termos da lei do lugar em que forem feitos. Apenas para produzir efeitos no país serão trasladados (art. 32, § 1º da Lei 6.015/73).
A consequência da inscrição após tal prazo será a mesma do parágrafo único do artigo 130 da Lei 6.015/73, relativo ao Registro de Títulos e Documentos: o registro feito depois de findo o prazo produzirá efeitos a partir da data da apresentação, não retroagindo à data da celebração. Ou seja, se inscrito no prazo referido, o casamento produzirá efeitos no Brasil desde a data da celebração. Por fim, deve ser ressaltado que, para os casamentos celebrados antes da vigência do Novo Código civil, o prazo de 180 dias deverá ser contado a partir da entrada em vigor da lei nova.
12. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS
O Novo Código Civil diz que, na hipótese de casamento de pessoas maiores de sessenta anos, é obrigatório o regime de separação de bens (art. 1.641, II).
O art. 2.039 preceitua que o regime de bens no casamento é regido pela legislação vigente na data da celebração. Assim, se a maior de cinquenta e menor de sessenta anos pretender casar na vigência do Novo Código Civil no regime de separação de bens, deverá comparecer com seu noivo, perante um tabelião de notas para a lavratura de pacto antenupcial. Vale observar que o art. 45 da Lei 6.515/77, que excepciona o vigente Código, continuará sendo aplicado, uma vez que a lei nova, estabelecendo disposições gerais a par das já existentes, não revoga a anterior (Lei de Introdução ao Código Civil, artigo 2º, § 2º). Persistirá, assim, a liberdade de escolha do regime de bens nos casamentos de nubentes comunhão de vida anterior a 28.06.77 e que haja perdurado dez anos consecutivos ou da qual tenha resultado filhos anteriormente à referida data.
13. REGRAS DE TRANSIÇÃO QUANTO AO REGIME DE BENS
O Código Novo extinguiu o regime dotal, já que havia caído em desuso, e instituiu novo regime de bens, qual seja, o de participação final nos aquestos. Neste novo regime cada cônjuge possui patrimônio próprio e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento (art. 1.672). Segundo a exposição de motivos da lei, o novo regime permitirá aos contraentes que contribuem cada um a seu modo, “à acumulação, salvaguarda e acréscimo do patrimônio familiar”, que ao terminar a associação conjugal, “possam, na ausência de convenções expressas em contrário, dividir em dois o que houverem adquiridos juntos”.
Na mesma exposição de motivos é feita a distinção entre o regime de participação final nos aquestos e o da comunhão parcial, “que implica aquela participação deste a celebração do casamento”, sendo que o novo regime poderá atender a situações especiais, especialmente quanto ambos os cônjuges exerçam atividades empresariais distintas.
Em relação ao regime de separação de bens, será permitida a livre alienação dos bens (artigo 1.687), e não haverá mais a possibilidade de comunicação dos adquiridos na constância do casamento, prevista atualmente no artigo 259 do vigente Código Civil, e, em relação à separação obrigatória de bens, na Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal.
Há, portanto, novas disposições quanto ao regime de bens do casamento, sendo necessárias regras de transição do artigo para o novo sistema legal.
O Novo Código Civil, no artigo 2.039, assim dispõe: “O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916, é por ele estabelecido”.
Assim, o regime de bens nos casamentos celebrados até dia 10/01/2003, ainda que religiosos pendentes de inscrição no registro civil das pessoas naturais, é o previsto pela legislação ora vigente. Os celebrados na vigência do Novo Código Civil, ainda que assinado o memorial ou expedida certidão de habilitação anteriormente, serão regidos pela nova lei.
E como não existirá mais a possibilidade de comunicação de aquestos no regime de separação de bens, em não havendo cláusula expressa quanto à comunicação destes no pacto antenupcial, deverá o registrador orientar os nubentes a lavrar a escritura, a fim de constar que pretendem casar no regime de participação final nos aquestos.
Quanto ao pacto antenupcial de regime de comunhão universal de bens ou separação total ou absoluta, sem comunicação de aquestos, revela-se desnecessária a sua re-ratificação. Contudo, não haverá nenhum prejuízo em re-ratificar a escritura de pacto para constar que o regime de bens do casamento será o definido pela Lei 10.406/2002 (Novo Código Civil).
14. CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO
O artigo 1.726 do Novo Código Civil estabelece que a união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.
Por sua vez, a Lei 9.278/1996, que atualmente regula a matéria, prevê a conversão da união estável em casamento, por requerimento ao Oficial de Registro Civil (artigo 8º).
Percebe-se que o legislador modificou o destinatário do requerimento. A redação induz à conclusão de que será necessário processo de jurisdição voluntária perante o Juízo competente para as ações atinentes ao Direito de Família.
Todavia, a interpretação dos dispositivos tem que ser feita à luz do artigo 226, § 3º, da Constituição Federal, o qual reconhece para efeito da proteção do Estado, a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, “devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
Ora, se o legislador constituinte pretende a facilitação da conversão da união estável em casamento, não poderia o legislador ordinário condiciona-lá a um procedimento mais complexo do que o previsto para o casamento. Ressalte-se, todavia, que a declaração da inconstitucionalidade do dispositivo caberá ao Poder Judiciário.
Enquanto não for definida pela Corregedoria Geral de Justiça a adequação do procedimento de conversão, o registrador civil deverá, após a vista do Ministério Público, encaminhar os autos ao Juízo competente, e, com a sua autorização, realizar a conversão da união estável em casamento. (REINALDO VELLOSO DOS SANTOS – Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais – 2º Subdistrito – Liberdade – S.Paulo-SP e membro do Conselho de Informática da Arpen-SP. E-mail: oficial@regitroliberdade.com.br - Telefone: (11) 3208-7897.